Tempo de Pipa

12 de junho de 2015

Nada, é impressão não. É essa coisa à toa mesmo. Só não é mais à toa do que você girando esse laço do vestido entre os dedos. Para com isso, menina. Torcer o laço não é torcer a questão, então nem adianta desviar esses olhos pro laço. Se eu oferecer um algodão doce, você olha pra mim? E se eu disser que sou um pedaço de nuvem, prestes a solver? Aí cê me olharia, eu sei. Olha, que sou nuvem é mentira, mas que essa coisa nossa no ar derrete, derrete sim, viu. Se eu fosse você, aproveitava para encontrar meus olhos com os teus, antes do líquido. O líquido nunca tem a graça desse vapor, e acaba por desaparecer por completo. Você sabe, Lavoisier não vale pra essas coisas. 

Os dedos de unhas rosadas passando pelos cabelos, esses cílios oscilantes e longos, o apertar dos lábios, essa forma de andar parecendo que vai cair a qualquer momento, fazendo a gente prender o fôlego na expectativa de te segurar, a voz macia... Você sabe que é mais culpada que eu. Para de desviar esses olhos, joga pro alto essa confusão. Que fosse menos inconsequente, mocinha. Agora, você não vai a lugar nenhum. Não mesmo. 

Medo não combina com isso, pequena. Eu só quero sentar bem ali, debaixo daquela árvore sob a sombra, ouvir uns passarinhos, te dar um algodão doce e ouvir você xingar, falando que é um absurdo alguém comprar açúcar em forma de nuvem. Eu sei que não é por isso. É porque você lembra que a gente também derrete na boca, e depois acaba, junto com o doce. O palito a gente joga fora, que ele não serve pra nada mesmo. 

A propósito, agradeço pelo botão pregado na minha camisa, era uma dó não poder usá-la. É por isso que eu digo, cê finge que não, mas sabe que é adorável, que é como uma pétala. Só tive a sensação de que outra coisa foi pregada com o botão. Não, eu não me importo se você esquentar os pés gelados em mim, nem de você gostar de ficar em silêncio. Só fique por perto, gosto de te sentir respirar. Você entende, seus olhos também vibram pelo sopro da vida. 

O que você é, enfim? O que você quer? Querida, não temos motivos ou razões, não percebeu ainda? Cê fica chata com perguntas. Cante-me com suas afirmações, que são muito mais aconchegantes. Fala sobre os gatos, sobre copos-de-leite, sobre o quanto gostou daquele laço de cabelo que lhe dei. Vem, vou fazer umas pipocas, faz um brigadeiro para nós. Daqueles seus, que de tanto achocolatado, ficam puxa-puxa de estalar nos dentes. Só para me provar que seu gosto pode ser ainda melhor. 

Suas mãos estão sempre geladas, meus dedos sempre machucados. Gosto de como você sorri com os olhos. Essa sua risada debochada não descomplica esses nós que formaram nossos dedos entrelaçados. É... agora é uma boa hora para se ter medo. Isso é patético, você diz, e isso não me ofende. Apenas sua defesa de camaleoa se aflorando. 

Por qualquer palavra, por qualquer sorriso, por qualquer cheiro que lhe dou... vem você com essa risada solta, que é um dos sons mais gostosos desse mundo. Também acho isso uma bobiça sem fim. Mas fazer o quê, as coisas bobas são sempre as melhores, são sempre as mais soltas, são sempre as mais tolas... 

Faz um tempo já, eu sei. Mas é bom ir te soltando aos poucos, cortar as asas pena por pena, pra você entender que é hora de eu ir. Sei que você ama beijos na testa, mas desse sei que não vai gostar. Não gostar vai ser um sentimento um pouco constante agora, a respeito das coisas. Fazer o quê... no início você oscilou porque sabia que era assim, tive que insistir. Alguém precisava te ensinar a valorizar algodão doce e a empinar pipas. 

Deixei um bilhete, com aquele perfume que cê gosta borrifado e uma trufa de cereja. Estava lembrando do seu jeito engraçado de me abraçar pisando nos meus pés. Sei lá...

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